sábado, 11 de outubro de 2014

Literatura

"Santa Maria de Itabira: na lavra do tempo"
A professora e escritora Joana d’Arc Torres de Assis resgatou precioso acervo, caro não só à gente de Santa Maria de Itabira, município da Região Central do estado. Afinal de contas, o dono dos guardados, Francisco de Assis Gonçalves (1847-1926), o Sô Cotta, foi guardião de um pedaço dos séculos 19 e 20 que agora nos chega. Cuidadosamente, esse fazendeiro, comerciante, político e rábula (advogado sem diploma, de muita serventia aos conterrâneos) juntou 12,4 mil manuscritos e impressos com registros da economia, dos costumes e da cultura de seu arraial.

No livro "Santa Maria de Itabira: na lavra do tempo", editado pela Fundação Francisco de Assis, Joana d’Arc não revela apenas a história de sua terra, que se tornou município nos anos 1940, mas já no século 18 via passar gente em busca de ouro e riqueza. Ali está um pouco das Minas Gerais que não se limitavam a Ouro Preto, Mariana, São João del-Rei, Sabará e Pitangui – joias da coroa de nossas pesquisas históricas. Sobretudo, conhece-se um pouco do dia a dia da Minas provincial.

Aquele arraial não era um ponto fora da curva, como se diz. Pelo contrário: a papelada de Sô Cotta registra a labuta do povoado (vizinho de Itabira) para plantar algodão e café; testemunha a saga dos tropeiros; informa sobre a luta para fazer sal, tecidos, louças e artigos finos chegarem à Minas profunda; explica também como se fazia para transportar café, gado e produtos da região até o Rio de Janeiro. Autora de vários títulos – boa parte deles remete a seu rincão –, Joana Torres não é historiadora e nem escreveu propriamente um livro de história. Ancorada em farta documentação, ela tece o que chama de “miúda contação”, garimpando pepitas entre as memórias de sua gente e de famílias que lá se radicaram e se entrelaçaram – entre Drummonds, Lages, Alvarengas, Guerras, Bretas, Andrades, Sampaios, Rosas, etc .

Se o boom do ouro foi breve no estado, limitando-se a poucos anos do século 18, esse livro, por meio das anotações e documentos de Sô Cotta, mostra que o pequeno povoado sempre tratou de cuidar de seu “mercado interno”. Seja plantando algodão ou café, procurando pedras preciosas (vem de lá a famosa água-marinha Santa Maria), cuidando de bois e porcos. Interessante notar a força do comércio, que, de acordo com a autora, está no DNA dos santa-marienses. Sô Cotta e A Primavera não negociavam apenas com Itabira ou Sabará, mas com firmas de Juiz de Fora, Carangola, Sete Lagoas, Ponte Nova, Ouro Preto, Mariana, Conceição do Mato Dentro e, claro, Rio de Janeiro. No século 19, havia 18 empresas no pequeno povoado vendendo pano, armarinho, louça, chapéu, ferragens, calçados, ferro de passar – várias delas ofereciam também pasto para a tropa ou acomodações para os chamados cometas, caixeiros-viajantes.

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